Temos a capacidade de expressar nossas necessidades e desejos e, consequentemente, construir entendimentos, promover acordos e conviver em harmonia. Todos os movimentos sociais de construção da paz passam pela forma responsável pela qual nos comunicamos. A mediação de conflitos é uma das maneiras que podemos utilizar para conviver melhor com nossas famílias e vizinhos, em uma comunidade, em uma escola e em locais de trabalho.
Desde que o mundo é mundo sempre recorremos a um terceiro elemento para nos auxiliar nos conflitos. Quando dois irmãos brigam recorrem aos pais ou adultos próximos. Quando alunos brigam recorrem aos professores. Quando vizinhos brigam recorrem a delegacia de polícia. Quando há desavenças nas famílias recorrem ao judiciário, e assim por diante até chegar aos países que estão em conflito e recorrem a ONU ou a outro Estado que não esteja envolvido diretamente no entrave.
A mediação de conflitos oferece recursos para que o terceiro elemento intervenha de maneira a promover o entendimento entre as partes, propiciando assim uma convivência saudável e segura.
As palavras são da psicóloga Célia Bernardes. Célia ministrou um curso sobre mediação de conflitos para os voluntários do Crea+ Brasil durante a Formação Inicial, no início do segundo semestre. A especialista se predispôs a colaborar com o projeto mais uma vez, explicando os benefícios e os desafios de se colocar a técnica em prática nos mais diversos ambientes escolares. Ficou interessado? Então confira a entrevista.
O que é mediação de conflito? Qual o seu objetivo?
Mediação de conflitos é uma metodologia não adversarial de resolução de conflitos e disputas. É um processo de diálogo e cooperação para resolver um conflito, em que um terceiro elemento auxilia as pessoas a encontrarem soluções satisfatórias para seus impasses, propiciando a transformação da relação entre elas. A função do terceiro elemento, o mediador, é auxiliar as pessoas a buscarem soluções que atendam suas necessidades. Sem a pretensão de eliminar os conflitos, oferece alternativas para manejá-los, buscando soluções construtivas, criativas e restaurativas geradas em um contexto de colaboração, diálogo e reflexão.
Em que situações a mediação de conflitos é indicada?
A mediação pode ser indicada para diversas situações, mas principalmente em relações continuadas no tempo como famílias, vizinhos, escolas, empresas e grupos sociais. A psicóloga Vania Yazbek explica que “a mediação vem se constituindo como um fenômeno de mudança e amadurecimento da sociedade. Considerando-se como uma expressão da crença no poder transformador do conflito, tem gerado consequências positivas para a convivência social que, ao construírem diferentes possibilidades de soluções para seus conflitos, reconstroem suas relações e a si mesmos. Essa abordagem, através da força transformadora do diálogo e da reflexão, aplica-se especialmente à solução de conflitos em relações com historia de continuidade no tempo, tais como, familiar, societária, comunitária, organizacional e institucional”.
Quais as maneiras de ser colocar a mediação de conflitos em prática?
Primeiramente precisamos buscar o preparo de pessoas a fim de instrumentalizá-las com as ferramentas comunicacionais da mediação para utilizar a prática como uma forma construtiva de manejar conflitos em equipes de trabalho, vizinhança, familiares, entre outros.
Quais os requisitos para se tornar um mediador de conflitos? Como os professores podem se preparar para se tornar um mediador?
O principal requisito é a voluntariedade, um dos princípios fundamentais da mediação. Em seguida é preciso fazer uma formação para desenvolver recursos de comunicação para auxiliar as pessoas a buscarem soluções para situações de impasses e conflitos. Há necessidade de realizar cursos de capacitação para poder utilizar as ferramentas da mediação adequadamente.
Quais os principais desafios para se colocar a mediação de conflitos em prática? De que forma podemos superá-los?
Há vários desafios que precisamos enfrentar para a prática da mediação, mas podemos destacar dois. Um deles é o desconhecimento da metodologia, uma vez que a mediação ainda é uma metodologia pouco disseminada. O outro é o costume de esperar que um terceiro elemento decida sobre algum conflito, impasse ou disputa que vivemos, reflexo da autonomia e do protagonismo poucos desenvolvidos em nossa cultura. Atualmente existe uma legislação que implanta os métodos de resolução de conflitos nos tribunais. Mas a divulgação e aplicação da prática em outros contextos como em escolas, empresas e comunidades são ações que vem paulatinamente superando os desafios.
Como a mediação de conflitos pode melhorar a relação entres os alunos? E entre alunos e professores?
Em outros países é comum a prática da mediação entre alunos, chamada mediação de pares. Alguns alunos são capacitados como mediadores e atuam em situações de conflitos entre alunos. Treinar pessoas da escola para intervir em situações de conflitos é muito útil para lidar com impasses entre alunos e professores. Manejar de forma construtiva e pacifica momentos de conflitos na escola gera resultados muito produtivos.
A mediação de conflitos traz melhorias no desempenho do aluno em sala de aula, como mantê-lo mais calmo e concentrado? Por quê?
Um dos pilares da educação no planeta, proposto pela Organização das Nações Unidas (ONU) é o “aprender a conviver”, portanto construir um ambiente cooperativo e respeitoso leva o aluno melhorar seu desempenho e seu aprendizado.
Podemos afirmar que a mediação de conflitos fortalece os laços de confiança entre aluno e professor?
Sim. Quando as pessoas têm suas necessidades atendidas, ficam mais tranquilas e portanto não precisam se defender ou atacar o outro, aumentando o grau de confiança e apoio.
Quais as principais mudanças observadas na estrutura da escola com a mediação de conflitos?
Comumente a mediação intensifica o clima de respeito e a aproximação dos adultos da escola com os alunos. Ela também minimiza o estresse dos professores e aumenta o protagonismo dos estudantes. Curiosamente um dos aspectos que sempre é ressaltado é a limpeza da escola.
Quais benefícios a mediação de conflitos pode trazer especificamente para um projeto como o Crea+ Brasil? Por quê?
As ferramentas comunicacionais da metodologia da mediação pode contribuir com os voluntários no sentido de construir uma equipe coesa e cooperativa, inspirando os alunos e os professores a desenvolverem o respeito e uma conexão maior entre eles.
Algo a acrescentar?
Acredito que o princípio da voluntariedade e a disposição de cooperar dos integrantes Crea+ é um movimento muito importante para desenvolver o recurso da mediação e, consequentemente, para construir uma sociedade mais justa e pacífica.
Célia Bernardes é facilitadora, capacitadora e coordenadora de projetos em práticas de Justiça Restaurativa. Licenciada pelo Instituto Latino Americano de Prácticas Restaurativas / International Institute for Restorative Practices (ILAPR/IIRP), integrante da Justiça em Círculo e sócia fundadora do Grupo de Mediação Educacional do Mediativa – Instituto de Mediação Transformativa, também atua como mediadora e capacitadora em mediação transformativa de conflitos e psicoterapeuta individual, de casal e familiar.
O CREA+
O Crea+ nasceu no Chile em 2003 a partir de um grupo de jovens que acreditam na importância da educação como ferramenta para superar a barreira da desigualdade social. Expandiu-se para o Brasil e para o Peru seis anos mais tarde, mantendo a essência voluntária e o foco na educação de crianças e adolescentes. No país, o projeto está presente em São Paulo (SP), na E.E. Prof. Daniel Paulo Verano Pontes e na E.E. Prof. Odon Cavalcanti, com aulas de matemática e atividades socioculturais e esportivas para alunos do sexto ao nono ano do Ensino Fundamental.
Para mais informações, acesse nosso site e curta nossa página no facebook.
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